Wednesday, May 21, 2008

Os impérios fazem-se com traições

Os impérios fazem-se com traições. Traições que tem muito a ver sobre a reafectação dos direitos sobre pessoas e os sítios. No entanto essas mesmas traições são também as sementes que precipitam a queda dos impérios, não tanto pela reacção das pessoas e dos sítios traídos mas pela inconsistência entre os novos direitos criados e a vocação restringida das pessoas e dos sítios.
Bom seria que não houvesse traições e que os espaços alargados não destruissem o saber acumulado nas pessoas e nos seus sítios. Mas sempre houve traidores capazes de vender direitos naturais e humanos por trinta dinheiros ou por meia dúzia de anos de poder. Muitos deles dirão que não tinham possibilidade de fazer diferente; muitos deles reinventam princípios que os autodesculpam. Princípios de traição, do género de que “é preciso colaborar com o inevitável”, ou de que “é a vida”, ou mais comum, de que “a culpa não é deles mas do sistema”. Vendo bem todos vamos sendo um pouco traidores. A única diferença é entre os que dão por isso, têm pena tentam melhorar, e aqueles que fazem por não dar por isso sustentados no suposto “inevitável”, na enfadonha “vidinha” ou no omnipresente “sistema”.
Falo-vos disto por causa da criação do Império Europeu. Concretamente quero rflectir sobre o Tratado Reformador Europeu ratificado ontem sem honra e sem glória pelo Parlamento Nacional. A traição subjacente a esta ratificação é bem concreta. Trata-se de transferir para a União Europeia toda a biodiversidade marinha existente no Mar que era português.
Numa altura em que todo o mundo se preocupa em valorar a biodiversidade marinha porque entende a sua função como fornecedor de recursos, garante de vida, regulador do clima, sequestrador de carbono, produtor de oxigénio e factor de resiliência dos ecossistemas, os nossos políticos passam todo este valor e a responsabilidade de gestão para as mãos de uns burocratas de Bruxelas e para as mentes de pessoas para quem a biodiversidade nunca teve a ver com as suas vidas e os com os seus saberes. A traição dos políticos portugueses é má por várias razões: - primeiro, porque troca aquilo que não lhes pertence por mais uns fundos comunitários conjunturais transferidos para financiarem acções de campanha eleitoral; segundo, porque sendo a gestão longínqua pior do que a gestão de proximidade, não parece que a transferência de recursos para a Europa seja garantia da sua gestão sustentável; terceiro porque, não assumindo o âmbito e a responsabilidade da sua traição, os políticos da traição acabam por precipitar de facto o fim da construção europeia cuja vocação sustentável nunca teve a ver com a venda abusiva e criminosa de direitos de propriedade, mas sim com a construção da paz e com a criação de um espaço alargado para o movimento livre de bens, de serviços, de pessoas e de meios financeiros.
O caso é grave porque os nazis e napoleónicos que sonham com a construção do Império Europeu, ou aqueles muitos que são capazes de trair para que aquela enormidade se consubstancie e, a prazo, se destrua, são os mesmos que se recusam a pensar e a fazer pensar. Onde está a investigação sobre a criação do Império Europeu? Onde estão os estudos sobre os efeitos da transferência para Bruxelas da gestão exclusiva da biodiversidade marinha?
Todos os dias nos damos conta dos desastres criados pelo facto de Bruxelas controlar os direitos de propriedade da terra. Os preços dos produtos agrícolas sobem e o mundo passa fome porque aqueles que têm capacidade para produzir são impedidos de o fazer. As zonas de mato natural são arroteadas porque uma lei estúpida de encabeçamento uniformizado, feita paradoxalmente em nome do ambiente, leva os agricultores a arrotearem mais terras. Os países pobres não podem produzir bens agrícola porque os europeus protegem produções ineficientes e por aí fora. Se isto são alguns dos desastres que vemos na gestão da terra quantos estaremos para ver associados à gestão do mar de Bruxelas!?

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